O dever do Estado Português de garantir um ensino progressivamente gratuito e o acesso de todos, segundo as suas capacidades, aos graus mais elevados do ensino, da investigação científica e da criação artística, consagrado no Art.º 74 da Constituição da República Portuguesa, continua esquecido por opção política dos governantes.
Enquadrada num longo quadro de subfinanciamento do Ensino Superior, a propina tem funcionado como um dos métodos de autofinanciamento para as Instituições e, obviamente, como um dos maiores entraves no acesso ao Ensino Superior.
O valor mínimo da Bolsa de Ação Social Escolar são 871€ por ano. Isto significa que um estudante que beneficie da bolsa mínima, após pagar a propina, ficará com 17.40€, por mês, para pagar alojamento, água, luz, gás, internet, transporte, alimentação e outros custos adjacentes, ficando estes ao encargo das famílias ou dos próprios estudantes, que acabam por se sujeitar a trabalhos precários (muitas vezes sem contrato e com sucessivas violações dos seus direitos laborais).
Ainda sobre a propina, os estudantes que depois da licenciatura querem prosseguir os seus estudos, com mestrado e doutoramento, deparam-se com valores exorbitantes: taxas de inscrição a 200€ ou propina mensal com valores três vezes mais altos.
A insustentabilidade deste modo de vida é, assim, uma das principais causas de abandono do Ensino Superior. É urgente a inversão desta tendência, o que só é possível com o fim da propina e com a desmistificação da ideia de que o fim da mesma é incompatível com o reforço das bolsas de ação social.
Quando se fala que as propinas são para acabar, fala-se da abolição da propina em todos os ciclos de estudos para todos os estudantes, sem deixar ninguém de fora.
Quando se fala em manter as propinas o que está a ser dito é: só pode aceder a um curso, a um mestrado ou a um doutoramento quem o puder pagar. Não nos deixemos enganar, isto não é um mero acaso, a manutenção do estado atual do Ensino Superior é uma opção política com uma ideia subjacente – a de fazer corresponder as elites económicas às elites do conhecimento.
A esta realidade no seio académico soma-se, para os estudantes que se vêem obrigados a trabalhar para sustentar os estudos, a precariedade laboral. Os estudantes continuam a ser os mais expostos à instabilidade e enfrentam cada vez mais novos métodos de exploração e precariedade que ficaram mais expostos com a pandemia. É evidente e percetível aos olhos de todos a instrumentalização dos estudantes e um aproveitamento das poucas condições económicas e sociais destes.
Em decorrência da condição de trabalhar e estudar, mais precisamente trabalhar para estudar, há uma profunda interferência nas atividades do quotidiano trazendo prejuízos físicos e psicológicos.
Com o passar das semanas, as necessidades do trabalho sobrepõem-se a qualquer necessidade pessoal e académica, começando então uma das lutas do trabalhador-estudante que não consegue aplicar o seu estatuto, afinal, dependemos daquele trabalho para pagar a mensalidade do curso, o transporte, os livros e tudo o que qualquer estudante universitário necessita.
Como se defende a emancipação dos jovens se o acesso aos graus mais elevados de ensino lhes é negado pelos inúmeros entraves económicos que se acentuam? Como se defende a emancipação dos jovens sem se assumir que, para que estes possam concretizar projetos de vida, é fundamental que tenham vínculos estáveis e salários que lhes garantam condições para construir, de forma autónoma, o seu caminho pessoal e profissional?
É hora de acabar com a propina, de reforçar a ação social para as despesas adjacentes, de garantir residências aos estudantes deslocados e de valorizar o emprego científico. É hora de efetivar um Ensino Superior público, gratuito, democrático e de qualidade.
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