10.1 C
Guimarães
Terça-feira, Abril 15, 2025

Os Heróis esquecidos de La Lys

Economia

Uma página de sangue e glória na história de Guimarães

Opinião de A. Lucas Freitas Martins

Assinalou-se nesta última Quarta-feira o 107º aniversário da ‘Batalha de La Lys’, o episódio mais trágico da participação portuguesa na 1ª Guerra Mundial. 

Na madrugada fria de 9 de Abril de 1918, quando o mundo inteiro parecia ouvir o sussurro de esperança de um fim próximo para a Primeira Grande Guerra, a terra da Flandres estremeceu. A operação ‘Georgette’, uma das últimas cartadas lançada pelas forças alemãs, incidiu principalmente sobre o sector defendido pelas tropas lusitanas, o que resultou na morte de milhares de soldados portugueses – entre eles muitos soldados vimaranenses, integrados na ‘Brigada do Minho’ e inseridos no Regimento n.º 20 de Infantaria.

Esta ofensiva começou com um violento bombardeamento de artilharia que assolou durante horas as tropas portuguesas entrincheiradas nas linhas da frente, matando em pouco tempo centenas de jovens soldados, esmagados pelo aço, soterrados pela lama e abafados pela poeira sangrenta. Seguiu-se depois um ataque de infantaria com superioridade numérica esmagadora que devastou as linhas defensivas lusas.

© Direitos Reservados

Perante tão brutal assalto, as forças portuguesas, que já se encontravam fragilizadas por más condições logísticas, falta de equipamentos e escassez de mantimentos, assim como a maioria das forças britânicas, fugiram da frente desamparados, não por cobardia mas por instinto natural.

Ainda assim, a resistência surgiu no meio do fogo, chumbo e sangue, por um punhado de homens que no meio do caos se tornara muralha diante da metralha da horda inimiga. Estes homens formavam a ‘Brigada do Minho’, composta pelos regimentos de Guimarães, Viana do Castelo e Braga. Camponeses calejados pela dureza da lavoura e operários endurecidos pelo labor do martelo, foram forjados pela fome e pela lide difícil da vida na província, tornando-se bravos soldados, famosos pela sua disciplina, coesão e dever, unidos pelo carinho tenro que nutriam pelas suas raízes minhotas, tal como menciona o tenente-coronel Vitorino Godinho em carta dirigida a Eugénio Mardel e publicada na sua obra ‘A Brigada do Minho na Flandres’.

«Cultivavam o culto pela província querida em que nasceram, acrescendo assim o espírito de solidariedade entre si, enraizando novas energias morais com o orgulho de pertencer à sua Brigada do Minho, cujas qualidades e méritos justificadamente procuravam engrandecer.»

Lutaram até ao fim e morreram de pé, mas este sacrifício heróico assegurou que parte das tropas aliadas pudessem retirar em segurança evitando assim a morte ou o cativeiro certo.

“Estes guerreiros de Guimarães preferiram conhecer o fim do que ceder à ignominia da desonra.”

Nesse fatídico dia, o sangue de Guimarães regou os campos belgas como outrora regara as terras lusas em guerras passadas. O Regimento de Infantaria n.º 20, composto por 746 soldados vimaranenses na véspera da batalha, ficou reduzido a apenas 189 homens de armas, perdendo cerca de 75% dos seus efectivos em algumas horas. Estes guerreiros de Guimarães preferiram conhecer o fim do que ceder à ignominia da desonra, seguindo assim um longo historial de conduta militar português marcado pela bravura e desprezo pela morte, erguendo-se com justiça ao altar da Pátria, onde alcançaram o lugar ao lado de outros tantos heróis nacionais. 

Apesar da relevância histórica e humana deste conflito, a memória desta batalha – e de toda a participação portuguesa na Primeira Guerra -, permanece apagada, em especial no nosso concelho.

O eco do sacrifício dos nossos mártires esbateu-se no tempo face a um desprezo dos dirigentes municipais, das instituições históricas e culturais, da sociedade civil e até dos vimaranenses.

© Direitos Reservados

Sobra apenas um pequeno monumento incompleto, esquecido no tempo e relegado para segundo plano no cemitério da Atouguia. Traídos em vida por um Governo que os retirou de suas mães e os enviou para o campo sangrento da batalha para uma guerra que não era a sua, foram também abandonados na morte. Ao fim de mais de um século, os mortos vimaranenses de La Lys continuam à espera de uma justiça simbólica devida. 

Mas enquanto houver um só coração que pulse com a verdade da sua coragem, enquanto houver uma voz que ouse gritar contra o silêncio, La Lys e os seus mortos viverão. E com eles viverão os nomes de Portugal e de Guimarães cravados na História – como sempre foi, como sempre será.

Nota: Deixo a minha total solidariedade para as instituições municipais histórico-culturais e seus funcionários. Imagino que organizar tantas exposições, marchas, comícios, festas, jantares, bailes e palanques para as comemorações do 25 de Abril consuma todos os fundos e esgote todas as energias disponíveis para um só mês. Terá de ser extenuante! Pobres é dos nossos soldados que escolheram o mês errado para morrer.

© 2025 Guimarães, agora!


Partilhe a sua opinião nos comentários em baixo!

Siga-nos no FacebookTwitter e Instagram!
Quer falar connosco? Envie um email para geral@guimaraesagora.pt.

PUBLICIDADE • CONTINUE A LER

Notícias Relacionadas

LEAVE A REPLY

Escreva o seu comentário!
Please enter your name here

PUBLICIDADE • CONTINUE A LER

Últimas Notícias