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Guimarães
Quarta-feira, Janeiro 29, 2025
Alcides Barbosa
Alcides Barbosa
Mestre em Habitação e Urbanismo pela Architectural Association, foi professor universitário e diretor do Sindicato dos Arquitetos no Estado de São Paulo. Ativista da ecologia política, é membro da AVE - Associação Vimaranense para a Ecologia e da Rede para o Decrescimento.

Queimar a casa na lareira

“Economia” deriva de “oikonomia”, que é a junção de “oikos” (casa) e “nomos” (administração). Originalmente, referia-se à administração da casa. Com o tempo, o termo passou a significar a gestão de recursos num sentido mais amplo, incluindo a organização e distribuição de riquezas em sociedades. “Ecologia” deriva de “oikologia”, formada por “oikos” (casa) e “logos” (estudo). Refere-se ao estudo da “casa e seus moradores” no sentido mais abrangente, isto é, o estudo das interações entre os seres vivos e o ambiente em que vivem. 

Administrar a casa não é tão diferente de cuidar do ambiente. Contudo, há governantes que parecem acreditar que é possível melhorar o conforto de uma casa ao mesmo tempo que a delapidamos. Para manter aquecida a “economia” é preciso passar por cima da “ecologia”.

Para aumentar o fogo de uma lareira (e o conforto momentâneo), faz sentido queimar portas e janelas? Só se a pessoa tiver o privilégio de estar muito perto da lareira. Aqueles que estão mais distantes passarão mais frio. E chegará a hora em que, para seguir a alimentar o fogo da economia, queimar-se-ão o teto e as paredes (já chegamos a esse ponto) e então a casa ruirá. É disto que se trata o recente alerta de ‘colapso climático’ pelo chefe da ONU.

O nosso sistema eleitoral (e económico) leva a que se privilegiem ações que geram conforto supérfluo a curto prazo para quem está próximo à lareira. Queima-se uma porta, aumenta-se o calor, ganha-se uma eleição (e lucra-se). As consequências só serão sentidas por quem está distante no espaço ou no tempo: é isto que chamam colonialismo climático e inequidade geracional ou, simplesmente, hipotecar o futuro. 

Os alimentos vêm de solos férteis, espécies selvagens polinizadoras, regimes de chuvas estáveis.

Não são necessárias imagens de satélite para se perceber que há cada vez menos matas, pássaros e nascentes. E até crianças sabem que os alimentos não vêm de fábricas, estas apenas os processam. Os alimentos vêm de solos férteis, espécies selvagens polinizadoras, regimes de chuvas estáveis.

Solos rústicos não são áreas que rendem pouco para a economia, são áreas vitais para a ecologia. Acabamos com tudo isto onde vivemos e contamos que sempre se poderá consumir o que a natureza produz alhures, mas o clima mostra-nos que a casa é uma só e tudo que se queima reduz a proteção que ela nos dá.

Se queremos uma economia sustentável, será preciso sustentar a ecologia. Isto implica que os governantes e parte dos moradores renunciem a alguns privilégios pelo bem de todos, incluindo as próximas gerações, que herdarão a hipoteca da casa. Menos estradas, menos valorização imobiliária, menos grandes superfícies. Mais agricultura de proximidade, mais moradias acessíveis no centro, mais comércio de vizinhança.

Guimarães pode e deve mostrar que não faremos o que é mais fácil e confortável, faremos o que é mais justo e sustentável. Mesmo que, para vivermos juntos numa casa digna e segura, seja preciso abrandar o fogo da lareira.

© 2025 Guimarães, agora!


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