No seguimento de um texto que publiquei em 2018, e depois de discutidas algumas questões de fundo, foco a minha atenção no ex-líbris das Festas da Cidade e Gualterianas: a Marcha.
Escusar-me-ei a uma resenha histórica muito alargada (fica para outra altura): primeiro, Marcha Milaneza, importada pelo Padre Gaspar Roriz, foi por este número, logo em 1907, utilizado o “Hino de Guimarães”, criado por Aníbal Vasco Leão para a primeira edição das Festas da Cidade (em 1906), com letra do já referido homem do clero. São ambos, hoje, passados mais de 100 anos, traços identitários desta cidade, logo, património imaterial.
Para quem assiste à Marcha, ano após ano, e para quem sabe, não deixa de ser extraordinário pensar que aquele aturado e minucioso trabalho ali vertido, naqueles carros, é concluído em menos de meio ano, com recurso, sobretudo, a mão-de-obra voluntária. Em pleno século XXI, não faz sentido.
Porquê?
Sendo Guimarães uma cidade voltada para a cultura, e para a abertura ao futuro, que aposta e que investe fortemente nessas áreas, é fulcral que sejam acautelados os tempos vindouros de uma manifestação tão singular na forma e no conteúdo. Não valerá a pena?
Os desafios e as ocupações de agora não são, com toda a certeza, os mesmos de há cinquenta, quarenta, trinta ou vinte anos. Nem os de há dez anos, seguramente. O trabalho artístico é um mester de direito próprio, e, se queremos cativar os mais jovens para a participação nestas iniciativas, não é recorrendo (sobretudo) a voluntariado que lá chegaremos, ainda para mais quando se sabe, porque é público, que o dinheiro investido noutras opções culturais, ou melhor, em mesteres praticamente equivalentes, é bastante mais avultado.
Quem conhece os meandros de quem trabalha para a Marcha Gualteriana, saberá, porque também não é segredo, que os obreiros, sobretudo os principais, não são, propriamente, e sem qualquer tipo de desmerecimento, jovens. Quem os substituirá, a médio prazo?
A verdade é que há ali verdadeiros mestres, professores que guardam o amanhã nas mãos e na mente. Haja quem queira disso usufruir, nas condições certas (e possíveis, porque possíveis).
Não queria fazer destaques individuais, porque todos os trabalhos que interessam são realizados por equipas, por grupos, em conjunto, mas uma vez que a própria Câmara Municipal de Guimarães, e muito bem, entregou uma condecoração, em 2017, ao senhor Salvador Silva, quero, eu próprio, e a título meramente pessoal, escrever, sem sombra para dúvidas, e ciente de que o faço, que este obreiro da Marcha Gualteriana (há mais de 50 anos) é um dos maiores artistas que Guimarães já viu. Inequivocamente.
A minúcia, a entrega, a abnegação, o sacrifício, a arte, a sabedoria, a experiência e, sobretudo, a coragem não têm, porque não podem ter, mensurabilidade. Mas podem ter, juntando-se-lhes, profissionalismo.
A meu ver, o futuro da Marcha Gualteriana só poderá ter um caminho, e esse é o do profissionalismo. A tempo inteiro, para trabalhadores. E é isso.
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