Economia Viva: entrevistas, reportagens, projectos, estudos e inquéritos.
- O planeamento urbano pode mudar a cidade? A importância do comércio, no universo da economia viva, na vida de cidade, oferece oportunidades de negócio, sem especulação, num projecto de urbanismo comercial consistente, com ideias concretas, metas e objectivos e com a adesão e participação de todos. Um profundo projecto de cidade, virado para o futuro.
- O último projecto de urbanismo comercial até agora conhecido, limitou-se a alargar passeios e mudar pisos e apoiar a requalificação dos estabelecimentos, com alterações de fachada e modernização das lojas, através de incentivos de um sistema de modernização do comércio que não chegou a todos. E não deixou de ser uma parceria entre comerciantes (via ACIG) e o Município, com apoios do Estado.
- Hoje, qualquer projecto de Urbanismo comercial passa por uma forte, decisiva e decidida intervenção da administração municipal, no espaço público, com a pedonalização das suas artérias principais e centrais, a ocupação de inúmeros prédios – então de habitação – com lojas âncora – de mais serviços, de um nicho de produtos de qualidade, alguns espaços de restauração que apresentem soluções diferentes, apostando em produtos gourmet, e lojas com história (na venda de produtos), sem somar mais cafés, mais lojas de óptica ou centros comerciais sem dimensão. E com uma componente de mobilidade que não se compadece com carros estacionados à porta de lojas – que não servem os consumidores que compram.
- Importa começar, planeando, sem medos e hesitações para não transformarmos o centro da urbe num deserto total, sem lojas novas e muito mais do que as instaladas, com a vontade política dos órgãos autárquicos, a imaginação de arquitectos, a visão dos pensadores da cidade (e não de visionários), deixando de lado o mero palpite ou a ideia solta. E o empreendedorismo de comerciantes e do chamado capitalismo vimaranense, hoje, mais vivo e actuante do que nunca.
A importância do urbanismo comercial na dinamização da cidade (centro e coração), do seu triângulo – ruas de Santo António, Gil Vicente e Paio Galvão – e do impacto da praça do Toural – pelo seu potencial turístico, monumental, agregador – como motor de um dinamismo concentrado no que foi a praça comercial de Guimarães, ainda não foi totalmente compreendida nem por comerciantes, nem pela Câmara Municipal. E muito menos pelos partidos políticos, sempre a defender o que são os seus (putativos) eleitores ou público alvo.
O público consumidor esse continua à espera que nessa área de ouro – de comércio, animação, de cidadania – alguém abra a ‘caixa de Pandora’ – dos segredos ali guardados e permita que aquele espaço citadino seja uma jóia da coroa comercial, arrebatador pela atracção e potencialidade de novos negócios, símbolo de uma cidade activa, viva. E com pessoas…
E não um pântano comercial onde se avolumam lojas de óptica – numa concorrência internacional frenética – bem típicas de uma superfície comercial e um deserto sem gente – com casas sem inquilinos, apodrecendo com o tempo e sem uso.
Parado no tempo, este nicho comercial sofre com as alterações da vida – e dos hábitos de consumo – dos cidadãos, das agressões vindas de grandes e médias superfícies comerciais, com uma oferta de espaço mais amplo para lojas atractivas, de estacionamento e produtos que facilitam a vida ao consumidor, de fora e de dentro.
Já há muito que se sentiu fome e sede de transformação neste verdadeiro triângulo de comércio, de serviços, de espaço de vivência e de cidadania.
Ainda há recordações e memórias sobre tentativas ensaiadas mas não totalmente concretizadas para mudar o comércio no centro da cidade, apostando fortemente na sua modernização. Houve até incentivos – quem não se lembra do Procom e do Urbcom, entre outros – aproveitados por alguns comerciantes para modernizarem os seus espaços.
Esteve sempre em causa como dar um novo alento ao aparelho comercial – formado por lojas e os seus donos, empregados e práticas comerciais.
Pensava-se, ainda no tempo da ex-ACIG – Associação Comercial e Industrial de Guimarães – que haveria luz sobre um planeamento urbano abrangente, de modernização comercial e de regeneração urbana, algo que fizesse a cidade comercial mexer para evitar a situação em que vive hoje.
Do lado do Município, houve decisão – ainda que contestada – de uma intervenção no coração da cidade, dando um novo ar à praça emblemática e tornando o jardim da Alameda um bosque. Hoje, é preciso ir mais longe.
Mas os mais ligados a este processo, continuaram a viver de palpites – que não é a mesma coisa de ter uma ideia, consistente, adaptável, uma solução: curiosamente, não houve consenso político forte para a transformação estrutural do urbanismo comercial da cidade.
PS e PSD mantiveram a mesma querela de antagonismo, durante anos: os comerciantes – tidos como mais próximos do PSD – alimentaram o antagonismo entre as duas forças políticas centrais na implementação das políticas públicas sobre uma questão que merecia uma abordagem menos conservadora. A questão de uma cidade sem carros não pode ser uma questão da rua de Santo António e dos seus comerciantes.
E esse antagonismo, foi-se mantendo – estendeu-se à mudança do mercado municipal para um novo edifício e uma nova área de atracção – e foi perdurando no tempo, com prejuízos evidentes para Guimarães.
E adiou qualquer projecto especial de urbanismo comercial em Guimarães – que evoluiu noutras áreas – deixando o comércio tradicional sem ‘rei nem roque’, sem associações vivas e fortes, alimentando a vaidade e enterrando uma associação que foi sempre mais comercial do que industrial, perdendo-se afogada em dívidas, alienando o seu património (raro) e perdendo uma dinâmica, deixando o comércio órfão de representantes. E alimentando um comércio de sobrevivência, com lojas mais velhas ainda que sem história.
Veio depois a proliferação de associações do mesmo sector, numa divisão alimentada por vaidades, que deixa o movimento associativo em mau estado. O que se vê, hoje, são associações sem força, com poucos associados, algumas querendo ser donas da cidade, outras alimentando uma espécie de associativismo prematuro e de vão de escada – que estende a mão à Câmara pedindo subsídios para actividades duvidosas e supérfluas ou um pequeno espaço para ter uma secretária e um armário que serve de arquivo, sem funcionários, nem quadros, num mundo a viver das ajudas da União Europeia para todas as áreas. E cada vez mais especializado.
O espelho desta Babilónia comercial continua a exibir a mesma imagem de sempre: um Narciso a perguntar quem é mais bonito do que ele, as soluções a tornarem-se verdadeiros palpites sem nexo, os partidos a dividirem-se ainda se o trânsito deve ficar parado, interrompido ou banido nas ruas centrais ou se o peão deve gozar de uma cidade atractiva – qualidade de qualquer urbe minimamente comercial e europeia. Pelo meio os comerciantes choram e clamam por milagres, numa cidade cujo centro quase fecha às 21h00. E o verdadeiro milagre está mesmo na pedonalização e na entrega do espaço público às pessoas, à animação, como se vê em importantes cidades europeias.
Na Câmara, o assunto é falado – mas não tratado – como aconteceu na reunião de 2 de Junho. E mais uma vez.
Do lado do PSD/CDS-PP (oposição) o clamor por uma cidade fantasma, definhada do ponto de vista comercial. Bruno Fernandes, andou por aí… a caminhar pela cidade, concluindo que no miolo urbano não se sente o efeito da economia. “E o que dirão os turistas que andam por aí?” – interrogou.

À volta deste triângulo comercial puramente urbano, não faltam atracções: o património classificado como mundial e da humanidade, no centro histórico e na zona de Couros, uma boa muleta para dar vida à cidade e suscitar atenção e pretexto ao visitante da cidade; um espaço público de qualidade e uma gastronomia – a dar sinais de evoluir – que deu um salto de qualidade com novos estabelecimentos e um serviço mais adequado a consumidores mais exigentes.
Porém, ao contrário de Belém… ninguém quer ver a riqueza deste presépio e das portas que abre para mostrar uma cidade mais animada. Potencialmente capaz de fomentar novos negócios, o património classificado é apenas um lugar de visitação (rápida) que não se mostra com um todo natural e harmonioso. E que tende a estar (mais) escondido e pouco explicado.
O vereador do PSD, virou turista e descobriu – o que já se vê a olho nu há muito tempo: uma cidade virada para deserto comercial e social, para uma minoria e não para uma comunidade. E não gostou de ver “a cidade graffit…ada, com lojas fechadas” e carros a passar nas ruas, numa espécie de turismo a 30 à hora.
O espaço público vai melhorando, com ruas, de pedra, limpas, a permitir ligações fáceis, apesar do estatuto patrimonial que têm. Uma estratégia bem sucedida – com resultados na classificação do património – que esconde outra estratégia mal sucedida – consubstanciada num estudo que apenas serviu para “lembrar a nossa identidade e a nossa garra”, a tal “garra vimaranense” que não se vê espalhada a outras áreas. “Um estudo mais para a gaveta” – criticou Bruno Fernandes.
A cidade tem atracção – por vezes os indicadores do ‘Booking’ baixam – mas os hotéis elevam os níveis de afluência, a gastronomia vive, o turismo dá vida ao Castelo e Paço dos Duques – como as estrelas maiores de uma atracção que é um chamariz para os povos da Europa, sobretudo.
“Não fazemos cidade para os turistas, mas para quem cá vive.”
E o vereador Bruno Fernandes lamenta que “a Gil Vicente já não seja, a rua das sapatarias”. Na mesma reunião e a seu lado, Domingos Bragança, presidente da Câmara também fala da cidade “singular” que é Guimarães, como termo de comparação com outras. E da sua “enorme reputação”, justificando que “não fazemos cidade para os turistas, mas para quem cá vive”.
Reconhece, porém, que “do ponto de vista comercial a cidade não está como nós queremos”… Adianta, mais uma vez, que “sem carros, é o que nós todos desejamos, esse é o nosso objectivo”.
Coloca o dedo na ferida e afirma que “os comerciantes estão agarrados a um modelo que não funciona”. Repete que o movimento no coração da cidade será mais forte, se a cidade “for entregue às pessoas”. E a pedonalização é um caminho que atinge vários objectivos da Capital Verde: a descarbonização do ambiente e a ocupação e a dinamização da urbe, desde o início da Alameda de São Dâmaso até ao fim da rua de Santo António e atrai as famílias para um espaço de cidadania.
O presidente da Câmara, acrescenta, um outro efeito da retirada dos carros do coração citadino: o comércio tradicional terá mais uma arma para enfrentar a concorrência das grandes superfícies, valorizando com a animação que poderá servir de atractivo a compradores.
Depois, aquilo que ainda é tão só um “palpite” e uma ideia sem projecto, é tornar a rua de Santo António um espaço aberto e coberto, que dinamize aquela artéria, recebendo mais lojas, alguns serviços, mais restauração e se ocupem as casas vazias.
Quem ganha? “O comércio naturalmente” – defende Bragança. Depois da aplicação do sistema de incentivos à modernização do comércio, de há umas décadas, o presidente recorda os projectos que estão em curso e que representam um sinal de que a Câmara quer mudar alguma coisa: o projecto para a pedonalização das ruas está em curso e o da criação dos ‘Bairros Digitais’, começará, em breve, a ser implementado.
Deu exemplo do Porto com cada vez mais espaços pedonais, uma forma de entregar as cidades às pessoas. Porém, as especificidades de Guimarães e da cidade com uma vasta área de património classificado, atrasam alguns projectos na Divisão do Património Mundial da Câmara, “por isto e mais aquilo”. Faz fé de que “tudo se vá resolver e resultar numa obra de qualidade e de concretização rápida”.
Para a Câmara Municipal, os comerciantes têm de perceber que “serão os primeiros beneficiários da apropriação de mais cidade pelas pessoas e da dinâmica que daí vai resultar” e convoca-os a todos – comerciantes e proprietários dos imóveis destas ruas – participando “neste novo modelo” de ocupação do espaço urbano, que “vai alterar a actualidade” de como se vive, compra ou passeia por estes arruamentos.
Também, lamenta, que para “estes projectos essenciais não tenha havido grande entusiasmo, porque com mais ou menos comerciantes, a economia do centro da cidade implica todos”.
Domingos Bragança afirma que “a Câmara não pode fazer tudo” e “muito menos substituir os privados que dizem que podem esperar por mais 50 anos para alterarem os seus prédios, as suas lojas, a sua propriedade”.
A propósito desta não cooperação dos proprietários dos imóveis nas ruas deste triângulo comercial, lembra a história de como a Câmara quis adaptar o Centro Comercial Santo António a loja do cidadão, “uma das tais lojas âncora” tidas como pêndulo de atracção de outra vivência comercial daquela rua. “A Câmara tem regras para respeitar sobre o preço que deve pagar pelos prédios que compra e tem de respeitar os valores fixados pelos avaliadores” – disse. Mas o dono do centro comercial não compreendeu a oportunidade do negócio… “todos esperam pelo amanhã mas a Câmara tem prazos a cumprir” – concluiu.
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