- José João Torrinha fala, nesta entrevista, sobre como se sente confortável no cargo que exerce, de presidente da Assembleia Municipal, o debate político que se faz no parlamento local e o funcionamento de um órgão do poder local que os vimaranenses começam a perceber e nele participar mais e melhor.
- O Partido Socialista e a sua vida interna e o desenvolvimento de Guimarães completam a entrevista em que José João Torrinha dá a conhecer as suas ideias, as certezas e as suas interpretações e convicções.
O CARGO POLÍTICO
Ser presidente da Assembleia Municipal (AM) representava alguma ambição no seu itinerário político?
Não, de maneira nenhuma. Na altura em que o convite me foi feito, primeiro, perguntaram-me sobre quem eu achava que deveria ser o candidato. Respondi com dois nomes que não o meu. E que acabaram por não se concretizar.
E o que representa a política para si?
A política surgiu de forma natural. Desde criança que em minha casa havia um discurso muito politizado pelo lado de meu pai. Era do MDP/CDE depois teve uma participação na candidatura de Maria de Lurdes Pintassilgo, para a Presidência da República. Mas não tinha participação partidária, porém, adorava discutir política. Eu cresci num meio de discussão política. Muitos anos mais tarde, já era trintão, quando senti que havia um partido com o qual alinhava então é que decidi entrar.
Não ambiciona mais do que ser presidente da AM?
Não.
Sinceramente…
Sim, sinceramente (peremptório). Não ambiciono mais nada.
Como se tem sentido na orientação da Assembleia?
Muito bem porque essencialmente tenho contado com a colaboração de todos os partidos. Desde que comecei, há seis anos, nunca tive nenhuma dificuldade, com os líderes sempre tive uma relação cordial e tenho respeitado e sido respeitado. Tem corrido muito bem.
E que avaliação faz desse desempenho institucional?
É sempre difícil ser juiz em causa própria. Sempre foi um ponto de honra ser o mais possível imparcial. Tenho tentado seguir essa preocupação à risca. Mesmo que dentro do meu partido possam não gostar muito. Tento abstrair a ligação partidária, em cada momento que tenho de tomar uma decisão. Integro um grupo parlamentar mas não sou presidente do PS (na orientação da AM). Sou o presidente da AM.
A AM tem-se prestigiado a si mesma para ter um maior reconhecimento dos cidadãos?
Tem sido feito um esforço de aproximação da AM aos cidadãos. Tentámos isso desde o início e vejo com agrado, ao longo destes anos, o número de intervenções do público tenha aumentado. Acho positivo. As reuniões descentralizadas que fizemos, em Pevidém, teve cinco intervenções do público; o facto de serem transmitidas online, também contribuiu para que mais pessoas, a partir de suas casas, possam assistir ao que lá se passa.Tem sido um esforço interessante. E a forma como têm decorrido, há sempre conflitos, mas não se tem passado dos limites. Isso também prestigia a AM.
“Devo confessar que tenho algumas saudades do tempo em que estava do outro lado e tinha de ir à luta.”
Qual foi o melhor momento vivido no parlamento local?
Os momentos mais interessantes acabaram por ser aqueles em que era líder parlamentar. A função de presidente é prestigiante mas aí é essencialmente um árbitro. Mas devo confessar que tenho algumas saudades do tempo em que estava do outro lado e tinha de ir à luta. Quer o primeiro mandato como deputado e depois como líder da bancada houve momentos muito interessantes do ponto de vista do debate político e que nos fazem crescer.
E o pior?
Eu acho que há um momento em que não podemos escapar e que as coisas não correram bem. Foi quando a sessão foi interrompida por causa das Nicolinas e da pandemia, Sou nicolino, integrante da associação e percebo a tristeza das pessoas e a decisão que ali foi tomada mas o que se passou ultrapassou o limite que não se deve ultrapassar.
Quando foi a ‘invasão ao Capitólio, nos USA’, viu alguma semelhança?
Não será tanto (rindo) nem tão grave. Depois de ter falado com algumas pessoas vieram a si e à razão. Não escondo que esse era um momento que não devia ter acontecido.
O DEBATE NA AM
Como avalia a qualidade do debate político: em Guimarães e na própria Assembleia?
É evidente que a qualidade do debate depende da qualidade dos interventores. Se houver qualidade o debate eleva-se e é profundo. Se os interventores tiverem menor qualidade o debate sofre com isso. Tenho notado desde o início, sem grandes flutuações, que há alturas em que é mais rico, noutras é pela rama, outras mais incisivo, outras mais superficial. Tem sido de uma qualidade interessante genericamente. Não faço nenhum juízo negativo.
Sente, por exemplo, que os presidentes de Junta têm medo de dizer que o ‘Rei vai nú’ na Assembleia com medo de represálias da Câmara?
Acho que não. Acho que os grupos parlamentares devem valorizar o papel deles. Se a lei lhes dá o direito de estarem presentes na AM por serem presidentes de Junta, eu acho que deve ser de corpo inteiro. E gosto quando eles intervêm e quando se comportam como deputado municipal. Medo de represálias não sinto, já senti noutros tempos. Se calhar ao contrário, aproveitarem aquele momento para exercerem qualquer crítica e estão no seu direito. Actualmente isso é menos evidente. Daí a dizer que têm receio, acho que não.
O facto de a informação da agenda não circular pela maioria dos deputados, uma vez que só os grupos parlamentares recebem as propostas que vão ser discutidas, isso não limita o debate político; outras vezes não se conhece mesmo os pormenores sobre o que vai ser discutido…
A documentação é toda enviada… para os grupos parlamentares. Sim, mas individualmente cada um pode aceder à documentação toda na sua plataforma. Se o fazem ou não isso já é outra questão.
Nota que, afinal, o debate político ocorre sempre sobre assuntos que a Câmara leva para ratificação, e sobre os quais os deputados não se podem dissociar dessa amarra?
Têm dois momentos em que podem sair dessa amarra. E até há momentos que são mais extensos: o período de antes da ordem do dia (PAOD) e a análise da actividade da Câmara. Esta análise é, por vezes, um segundo PAOD e quando chegamos ao fim dessa discussão já passaram duas horas, já é meia-noite e ainda não entramos à ordem do dia. Tem de haver limitação de tempo. Já tivemos três reuniões numa sessão da AM e tudo bem não podemos tornar a Assembleia ingovernável.
“Eu gostava de ter mais mulheres a participar e aliás é uma coisa interessante.”
Esse debate também está limitado pelo sexo dos eleitos, maioritariamente homens?
Eu gostava de ter mais mulheres a participar e aliás é uma coisa interessante. O ano de 2013 foi ano de alguma viragem na vida municipal com a entrada em vigor da limitação de mandatos. Tivemos muitos presidentes que saíram e houve uma regeneração interessante. E também houve a esse nível, apareceram várias presidentes de Junta, coisa que antes não havia em tão grande número. Daí para cá essa evolução não continuou. Estamos mais ou menos com o mesmo número quando se esperava que com a presença delas não se cumprisse estritamente as quotas mas fosse para além disso.
Distinguiria alguma mulher nas lides parlamentares, de ontem ou de hoje?
Há uma que é incontornável Paula Lemos Damião e que já lá está há muitos anos. Distingue-se por duas coisas: é uma das decanas, não sei se será única como tem um estilo muito próprio e que sai fora dos cânones e quem sempre gostei apesar de não ser do meu partido. Sempre gostei e gosto.
Mais?
Há outras: o PS tem uma mulher a liderar, o que é de valorizar. Gosto de ouvir a Gabriela Nunes. Tivemos a Mariana Silva (CDU) no passado que era extremamente combativa, a própria Sónia Ribeiro (BE).
E o que pensa da intervenção dos mais jovens no universo político-partidário?
Também temos tido. No passado ainda houve mais, no passado houve uma integração de mais jovens da JS e com muitas intervenções nesse período. Neste mandato tem-se notado menos mas tem havido rejuvenescimento.
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