O jornalista Carlos Fino, que foi correspondente da RTP em Moscovo, Bruxelas e Washington, acaba de lançar o livro “Portugal-Brasil: Raízes do Estranhamento”.
Editado pela Lisbon Press, a obra de 500 páginas é fruto da sua tese de doutoramento em Ciências da Comunicação na Universidade do Minho, em conjunto com a Universidade de Brasília.
Apesar do reiterado discurso político-diplomático sobre os “laços de sangue e de amizade”, Carlos Fino – na sequência de outros autores que se debruçaram sobre o relacionamento bilateral – considera haver “um estranhamento” mútuo, impedindo o aprofundamento das relações: os portugueses tendem a subvalorizar o Brasil, enquanto o Brasil alimenta, desde a independência há 200 anos, um anti-lusitanismo que se prolonga até hoje nos livros didácticos e nos média.
Um sentimento que, diz, de tão repetido se naturalizou, a ponto de muitas vezes não ser sequer consciente.
De acordo com o autor, tal faz parte do próprio DNA da nacionalidade brasileira, que, para se formar, teve que se contrapor à portuguesa. Esse anti-portuguesismo de carácter histórico não se estende, é certo, ao Portugal contemporâneo, que muitos brasileiros apreciam, onde milhares trabalham e muitos adquirem casa, em busca de melhor nível de vida e segurança; mas isso não apaga o preconceito enraizado contra a herança lusitana, vista pela corrente lusófona dominante como a origem de todos os males do Brasil, refere.
Exemplo flagrante desse anti-lusitanismo – que começou ainda no século XIX, com os liberais do Império, se acentuou na República com os jacobinos e se prolongou, a partir dos anos 50 do século XX, na intelectualidade de inspiração marxista – é o facto de o Brasil não celebrar sequer a chegada de Pedro Álvares Cabral, claro sinal de rejeição do ato fundador, como já notara Eduardo Lourenço.
Carlos Fino realça que o aumento das trocas e dos fluxos humanos a que assistimos nos últimos anos não chega para reduzir o estranhamento instalado. Para o investigador, Portugal “tem, por um lado, que debater o lado maldito da sua herança colonial”, ainda marcada pela exaltação salazarista de feitos como os Descobrimentos, e por outro “garantir presença mediática muito mais visível e persistente no Brasil, designadamente através da agência Lusa e da RTP, que desde os anos 90 tem uma RTP-África, mas inexplicavelmente nunca criou uma RTP-Brasil”.
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