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Sábado, Novembro 23, 2024

“Não acho que tenha sido um erro político” de Domingos Bragança

Economia

  • Nesta entrevista, José João Torrinha é convidado a falar sobre a saída de Ricardo Costa da vereação, o poder “exagerado” do PS no parlamento local, onde os socialistas são os ‘donos do relógio’. O que fazer para equilibrar mais os debates?
  • E analisa como a AM não tendo uma agenda própria de debates, serve apenas para aprovar propostas da Câmara, sem as poder alterar.
  • Não concorda que haja deputados (eleitos e presidente de Junta) a usar constantemente a suspensão do mandato por 30 dias, o que pode fazer com que alguns sejam membros do órgão deliberativo e passem o mandato sem participar em qualquer sessão.
  • O outro tema é o PS… e como vê o partido depois da candidatura sem êxito de Ricardo Costa à Federação, a partir da qual, os socialistas ficaram divididos ao meio, em duas facções.

O FUNCIONAMENTO DO PARLAMENTO

Sobre o funcionamento da AM, reconhece que a oposição está limitada, pelo tempo e pela informação que vai tendo da gestão municipal?

Há dois modelos que podemos seguir. Há assembleias, noutros concelhos, onde a repartição do tempo é igualitária, todos os partidos têm o mesmo tempo; quando entrei já não era assim, ou seja, os tempos era distribuídos proporcionalmente. Tentei e movi alguma influência para que houvesse alguma aproximação. E de facto houve. Os partidos menos representados que passaram a ter mais tempo e o PS como mais representado com menos tempo. Conseguiu-se aqui um equilíbrio interessante. Também percebo que um grupo parlamentar com mais de 60 elementos não pode ter o mesmo tempo que um grupo com um deputado só.

O regimento favorece o poder, já que o PS e a Câmara são ‘donos do relógio’ da Assembleia?

Não. Parece-me que foi conseguido aqui um equilíbrio interessante entre representatividade e ter um mínimo de tempo para se fazer uma intervenção política decente. Acho que esse equilíbrio foi encontrado na última revisão do regimento.

Não é preciso fazer mais nenhum equilíbrio ou ajuste?

Há neste momento uma revisão em curso do regimento. E há uma série de ajustes em cima da mesa para melhorar e aproximar as posições das partes.

O que seria possível fazer para equilibrar mais o debate respeitando maiorias e minorias, de acordo com os resultados eleitorais, uma vez que os deputados estão quase em permanência ao serviço da Câmara votando as propostas oriundas do executivo num corre-corre. Concorda?

Há os constrangimentos da lei e a regulação do que vem da Câmara para ser aprovado pela Assembleia. Estamos limitados por aí. O que eu acho e isso tem sido interessante neste mandato – acontecia muito nos mandatos anteriores – era passado o período de antes da ordem do dia, havia o tal corre-corre de que fala e os pontos eram votados em catadupa do “quem vota a favor, quem vota contra, quem se abstém”. O que tenho notado, neste mandato, é que não há ponto onde não haja intervenção. Isso é novo. Acho bem… podem dizer mas isso estende no tempo as sessões. Mas nós estamos lá é para isso. E não para despachar no tal corre-corre.

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Como quem coloca o selo branco e rubrica…

…o selo branco e ponto final. É uma boa evolução!

A AM não devia ter uma agenda própria de debates, para além da agenda do executivo municipal?

É curioso que também nisso há uma evolução. Recordo-me de que as assembleias extraordinárias só aconteciam quando a Câmara não conseguia encaixar nas sessões ordinárias assuntos que queria ver aprovados rapidamente. E não esperava pela próxima. Mesmo quando foi a primeira candidatura da Capital Verde foi possível incluir na agenda. Neste mandato, já tivemos uma sessão extraordinária sobre a Mobilidade. E lá tivemos e vamos em Julho sobre a segunda candidatura da Capital Verde. Ainda não estamos a meio do mandato e já levamos duas extraordinárias convocadas por iniciativa dos partidos e não da Câmara.

E porque não funcionam as comissões?

Essencialmente a tradição em Guimarães é que as comissões não funcionem de forma permanente, como em Municípios de grande dimensão caso de Lisboa. Quando há um tema que se reclama seja discutido a nível de comissão, abre-se a comissão e ela trabalha. Já aconteceu isso com a Capital Verde Europeia e mais lá trás com a CEC 2012. Se os deputados entenderem dever activar mais comissões é uma questão de proporem e a Assembleia decidir. O presidente não tem nada a opor-se.

Tal como o número de sessões?

Exactamente a mesma coisa.

“Já fiz ver o meu ponto de vista que em Guimarães se deve adoptar este princípio.”

Votar a oferta de uma bandeira do Município na AM merece-lhe que comentário? 

Uma excelente pergunta. Eu entendo, há já algum tempo, que há matérias que não têm dignidade para serem votadas na Assembleia Municipal. E sei que noutros Municípios há uma interpretação da lei sobre se é necessário que certas deliberações sejam votadas na Assembleia Municipal. E já encontraram a solução. Já fiz ver o meu ponto de vista que em Guimarães se deve adoptar este princípio. E este assunto não tem dignidade para suscitar discussão e aprovação do plenário de deputados.

E o público cidadão e eleitor, como vê a sua participação nas sessões, assistindo ou questionando? É positivo?

Sim, muito positivo. Tem havido muitas intervenções – e com qualidade – que interpelam os grupos parlamentares com questões muito pertinentes e com argumentação interessante. É evidente que nessa participação há um amargo de boca porque – muitas vezes as pessoas querem ser esclarecidas e quem tem os esclarecimentos é a Câmara. E pelo regimento, a Câmara não pode responder ao público. E os grupos parlamentares normalmente limitam-se a agradecer o contributo. E a dizer que vão colocar as questões à Câmara.

Isso também é para ser revisto no regimento?

Eu percebo os (dois) argumentos, de que a Câmara pode responder ao público e dos que pensam que não pode responder. Por um lado, o que as pessoas querem é a resposta da Câmara; e por outro há um lugar próprio para que essas perguntas possam ser respondidas que é as reuniões da Câmara. E que neste caso – de a Câmara poder responder – estaríamos a abastardar o papel da Assembleia.

No seu entender quais seriam as reformas necessárias deste poder local instalado?

Já há muito que defendo que a forma de funcionamento do executivo municipal deve ser à semelhança do Governo: um executivo monocolor, quem ganha constitui o seu governo e a Assembleia deve ter poderes reforçados de fiscalização, ou seja fazer a sindicância da acção municipal, com mais reuniões. É um modelo que eu vejo muita gente a defender mas chegada a hora de passar isto à prática nunca há a coragem política de o fazer. Houve um momento em que o PS e PSD convergiram nesta reforma. E nada foi avante.

O comportamento de alguns deputados em algumas não é muito bom…

Quer dar exemplos?

Por exemplo. nunca reparou que há aqueles, incluindo presidentes de Junta, que suspendem o mandato, ausentando-se por 30 dias, de forma sistemática e permanente em todas as sessões?

Há efectivamente casos de deputados que pedem consecutivamente a suspensão por 30 dias para que sejam substituídos por outros deputados. Acho mal. Ninguém obrigou as pessoas a candidataram-se aquele lugar. Se o fizeram é porque tinham um contributo a dar, se não tem contributo a dar a lei dá-lhes a solução de renunciar ao mandato. E entra mais um deputado da lista. É uma má prática.

Qual é a percepção que sente dos vimaranenses sobre a AM?

Acho que os vimaranenses encaram a Assembleia como o lugar onde podem apresentar as suas queixas e pontos de vista. Quando falo com as pessoas porque estão insatisfeitas com alguma coisa é curioso porque não ouvi ninguém declarar “vou à reunião de Câmara” dizer qualquer coisa. As pessoas efectivamente encaram e olham a Assembleia como o sítio – se tiveram algo a reclamar é lá que eu eu tenho de ir. Acho isso interessante e positivo. Sem prejuízo de poderem ir à reunião de Câmara. Eu percebo quais são as dificuldades: a reunião de Câmara é durante o dia em período de trabalho e a Assembleia é em período pós-laboral. Agrada-me que a Assembleia seja vista como o lugar onde os cidadãos vão expor os seus problemas.

O que tem a dizer sobre a qualidade do pessoal político que tem sido eleito?

Tem havido rejuvenescimento e regeneração e que os deputados que integram a AM têm feito intervenções de qualidade.

© GA!

O PS 

O partido não está viver o melhor momento no que toca à sua unidade interna. Porquê?

É preciso começar por dizer uma coisa: é normal que os partidos tenham dentro de si pessoas que pensam de maneira diferente. Às vezes é possível conciliar essa divergência… de forma muito fácil e às vezes é menos fácil. É normal que em períodos eleitorais quem ache que tem condições para encabeçar determinado projecto se apresente a votos. E se houver mais que um… que disputem eleições um com o outro. Não vejo isso como nenhum drama. Se me perguntar: preferia que estivéssemos todos no mesmo sentido e que houvesse a unidade de que muito se fala. É evidente que sim. Mas também não fico demasiado preocupado em haver mais que uma tendência e mais que um projecto dentro do PS.

Não estranha que isso possa acontecer na próxima eleição da Comissão Política?

Não estranho. Não sei se vai acontecer ou não mas se isso acontecer como já aconteceu na anterior… não estranhei na anterior e não vou estranhar na próxima.

Sente que isso acontece mesmo por divergências ideológicas?

Divergências ideológicas se calhar não. Francamente é mais a forma como se percepciona a actividade a nível do Município e quem acha que tem as melhores condições para levar à prática o projecto do partido.

Acha que tudo começou com a candidatura de Ricardo Costa à Federação distrital?

Olhando para a história do partido esse foi um primeiro momento em que houve alguma divergência… Pelo menos – é preciso fazer declaração de interesses – eu só estou nisto desde 2009. E sei que para trás de 2009, se calhar conhece melhor do que eu, houve muitos momentos de divergências, dissidências. Desde que eu entrei, o primeiro momento em que notei claramente uma divergência interna foi esse.

Parece certo que a eleição para um novo mandato da concelhia terá, outra vez, uma concorrência bipolar, de dois blocos que não se entendem no conceito de unidade, não por divergências ideológicas mas antes pela “posse” do poder?

Acho que não. Tenho em boa conta os camaradas que protagonizaram esses momentos e não acho sinceramente que isso seja um factor. É evidente que as pessoas têm as suas ambições e os seus projectos e a vontade de os levar à prática. Tem toda a legitimidade para o fazer.

“Vejo gente das freguesias, com posições relevantes com lugares interessantes na estrutura do partido e não só.”

A classe política local é, hoje, uma elite de Guimarães ou não?

Sinceramente é menos hoje do que já foi… Vejo, por exemplo, que protagonistas no partido que não são meramente chamados “meninos da cidade” como eu. Vejo gente das freguesias, com posições relevantes com lugares interessantes na estrutura do partido e não só. Não vejo tanto essa elite de que fala, vejo mais um PS transversal. Vejo mesmo, francamente.

Nunca se pronunciou sobre a saída de Ricardo Costa da vereação, acha que foi um erro político ou não?

Há decisões que são unipessoais. Eu entendo – e defendi isso na altura e defendo agora – que o candidato a presidente da Câmara deve ter liberdade para escolher a equipa com quer trabalhar. Quando o presidente anunciou essa decisão, eu só tinha de respeitar. Foi uma decisão que ele tomou nas suas opções.

Hoje, que avaliação faz? Foi mesmo um erro político ou não de Domingos Bragança?

Não acho que tenha sido um erro político. Acho que o presidente tomou uma opção da avaliação que fez na altura. Não creio que ele próprio esteja convencido de que tenha cometido um erro.

É que Ricardo Costa foi substituído por Nelson Felgueiras, um ex-JS que está na ribalta política por causa da sua função como vereador e da ligação a associações… Já se debruçou sobre isto?

Não sei se foi uma substituição directa mas passou a integrar a lista quando antes não a integrava. O que eu posso dizer sobre isto… quando me pergunta se já reflecti sobre isto. Assim como eu disse que a decisão era uma decisão unipessoal do presidente da Câmara. Esta também é uma decisão unipessoal do presidente da Câmara que tinha de avaliar o que é que devia de fazer sobre o que foi noticiado. E a decisão de decidir uma auditoria sobre estes factos não deve assustar ninguém porque beneficia todos. Estou solidário com a decisão que o presidente da Câmara tomou.

O acto em si, em termos políticos, é grave ou não?

Quando o presidente constitui a sua equipa tem de estar sempre confortável com quem a integra. E se ele entendeu que era bom fazer-se a auditoria e que era bom enquanto ela decorresse o vereador não tivesse os pelouros atribuídos, ele fez tudo para defender o interesse público. E por isso também estou solidário com ele.

Concorda com o líder da oposição que entende que Nelson Felgueiras já não tem condições para exercer funções na vereação?

Não me vou pronunciar sobre isso por uma razão: eu integro o órgão fiscalizador da Câmara e não vou dizer nada que possa perturbar o que, neste momento, está em cima da mesa, a auditoria e que no final o presidente é livre de tirar as suas conclusões, sejam elas quais foram.

Que papel espera ter no futuro do PS?

Nenhum… (riu-se com uma forte gargalhada).

Admite liderar uma terceira ou quarta via?

Não, de maneira nenhuma. Estão fora… e está de parte qualquer intenção nesse capítulo.

Vai manter-se na mesma ‘trincheira’?

Não tenho ‘trincheira’ nenhuma. Sempre encarei a minha passagem pela vida política como isso mesmo, uma passagem. Começou comigo já trintão e o fim não deverá estar muito longínquo. Não tenho nenhuma ambição a esse nível.

O que pensa daqueles que defendem o José João Torrinha como o homem ideal nesta situação de desunião do partido?

Respeito muito quem pensa assim. Agradeço muito que falem no meu nome. Mas se alguém estará com essa expectativa é bom que desista dela porque não vai acontecer.

Como vê entrada de militantes na secção sem vontade própria mais a pedido deste e daquele prejudica o PS, enquanto partido?

Vou dizer assim: eu prefiro o partido com menos militantes mas todos estejam convictos que é ali que querem do que um partido com exércitos de eleitores.

Isso não altera a essência do ser socialista?

Se estamos a falar – independentemente de quem possa enveredar por esse caminho, sabemos que é um fenómeno generalizado – esse é um caminho em que não me revejo, de maneira nenhuma.

Espera evolução neste desaguisado interno, uma evolução e se resolva até 2025 ou isso é um sinal de vitalidade partidária?

Espero que sim. Acho até que se os intervenientes políticos que neste momento estão à cabeça das tendências que há no PS têm verdadeiramente a vontade de construir um caminho de união, há duas coisas a fazer: A primeira, é se é altura para se sentarem à mesa, devem fazê-lo sem pré-condições. Nenhumas; A segunda é se porventura chegarem à conclusão de que não é possível essa união pré-eleitoral, pelo menos pós eleições internas se unam imediatamente à construção do objectivo que é 2025.

O PS tem alimentado, como devia,  o debate sobre as grandes questões que interessam a Guimarães ou aposta mais na fulanização dos cargos e da decisão de novos eleitores/militantes?

Acho que tem sido feito um esforço assinalável da parte da actual Comissão Política concelhia em promover esse debate. Isso tem acontecido. Desse ponto de vista – não ando atento ao que fazem outros partidos – mas no meu partido vou estando atento e esse debate tem sido feito por esta Comissão Política e isso é de reconhecer.

É necessário?

Claro que sim…

Não belisca a iniciativa da Câmara?

Não, de maneira nenhuma. Eu acho que muitas vezes se fazia era outra coisa: isto é muito frequente em todos os partidos, nos períodos pré-eleitorais, quando estamos à bica das eleições autárquicas toda a gente faz fóruns da sociedade civil. Eu acho interessante que isso se faça no mandato todo e não só para cumprir calendário.

O PS de hoje tem comparação com o passado, a nível local?

É um partido muito diferente. Já era diferente daquele que eu encontrei quando cheguei. É normal, evoluiu com o passar dos anos. Eu entrei em 2009, já passaram 14 anos, é muito tempo.

Mas discute-se menos a ideologia e mais as escolha de lugares…

Não sei. Eu tenho para mim que a escolha de lugares é algo que nunca, a mim – não o digo só por vaidade pessoal – é verdade; nunca pensei em ser nada no partido. No meu caso foram surgindo naturalmente. Mas acho que a escolha de lugares é tão antiga como os partidos.

LER MAIS: PARTE 1 \ PARTE 3

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