A concretização de movimento corporal obedece a um determinado controlo neuro motor, desde gestos simples até outros mais complexos, controlado por estruturas centrais que delimitam uma tarefa a executar. Muitas vezes quando esse gesto específico, e pelas mais diversas razões, não é bem executado, encontrámo-nos perante a existência de uma possível lesão. As nossas ações têm repercussões externas e visíveis é certo, mas para que isso suceda existem numa primeira fase uma série de modificações intrínsecas. Se reportarmos esta situação à estrutura designada de cartilagem, verificamos que este elemento é fundamental para que os movimentos do corpo humano possam ser realizados com harmonia pela estrutura articular. A cartilagem funciona como um “amortecedor”, protegendo a superfície óssea em termos articulares de grandes impactos inerentes às nossas atividades diárias.
A realização de atividade física ao longo do tempo, com vários graus de intensidade em diferentes condições e contextos, acarreta lesões cartilagíneas (modifica propriedades e compromete quase sempre a função articular) que apresentam uma severidade maior em termos de recuperação comparativamente a estruturas como ligamentos, tendões ou os próprios ossos, pois a cartilagem é descrita como sendo uma estrutura muito peculiar e de função única. Se observarmos a cartilagem articular constatamos que na sua composição existem células (condrócitos), água e uma estrutura de matriz macromolecular (colagénio, proteoglicanos e proteínas não colagénias e glicoproteínas). Esta não apresenta estruturas nervosas, vasculares ou componentes do sistema linfático.
“Uma característica fundamental da cartilagem articular é a capacidade de se submeter à deformação e depois se reverter à forma original…”
Encontra-se também delineada por zonas ou camadas, como sendo, zona superficial, zona intermédia, zona profunda e zona de cartilagem calcificada. Uma característica fundamental da cartilagem articular é a capacidade de se submeter à deformação e depois se reverter à forma original. Esta característica é essencial na lubrificação da articulação e na circulação do tecido fluido, principalmente devido à função de suporte de carga e porque a mesma não possui sistema linfático e suporte vascular.
Sendo a cartilagem uma superfície lisa, mais superficial comparativamente ao osso subcondral, de coloração branca e avascular, a situação inflamatória não existe se a lesão for só na mesma. Porém, quando o evento traumático atinge a cartilagem e o osso subcondral (mais profundo), os vasos sanguíneos da estrutura óssea potenciam um processo inflamatório que dá início a uma possível reparação da lesão. Apesar disso, a zona da cartilagem afetada é preenchida por fibrocartilagem que não é de todo igual à cartilagem hialina de base.
O tratamento a definir deve ter sempre em conta três grandes grupos lesionais, desde logo, perda de macromoléculas de matriz ou rotura da estrutura macromolecular sem rotura visível do tecido; rotura mecânica da cartilagem articular e rotura mecânica da cartilagem articular e osso subcondral. Importante perceber que as cargas (intensidade e tipo de pressão) aplicadas na cartilagem de forma consecutiva que abordem as estruturas anteriormente mencionadas, aparecem mais correlacionadas com a prática desportiva nos seus diferentes níveis profissionais de uma forma mais agressiva, comparativamente a indivíduos de faixas etárias mais avançadas que suportam modificações cartilaginosas devido ao envelhecimento natural e global da estrutura.
A reparação cirúrgica aparece de momento como a indicação mais efetiva em caso de lesão da cartilagem articular, mesmo existindo atualmente uma continuidade na investigação cientifica sobre qual a metodologia de tratamento (Fisioterapia, viscosuplementação com ácido hialurónico, entre outros) e qual a técnica cirúrgica mais eficaz para proporcionar ao indivíduo o resultado mais efetivo na busca de uma maior qualidade de vida.
Relativamente, ao conjunto de artefactos noticiosos diários sobre uma imensidão de soluções milagrosas e da existência de uma porção mágica, referentes a toda uma “suplementação” que “regenera” as articulações e respetiva cartilagem articular que invade diariamente os nossos sentidos, é fundamental mencionar que a cartilagem articular tem uma capacidade de regeneração limitada devido à ausência de vasos sanguíneos e à baixa potência mitogénica dos condrócitos, sendo que, quando atingida, a auto-regeneração da zona lesada não é possível.
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