Há necessidade de mudar o paradigma do sistema nacional de saúde, em favor do cidadão. Contudo, a mentalidade do utente também deve acompanhar esta mudança.
Será a ULS – Unidade Local de Saúde – a solução para a melhoria dos serviços de cuidados de saúde primários pelo SNS?
No fundo, o ciclo de debates que o secretariado do PS – Guimarães entendeu promover, discutiu a saúde apenas do ponto de vista público, deixando de lado o contributo que as unidades privadas dão ao bem-estar do cidadão e o modo como tornam o acesso à saúde mais democrático. E mais eficiente.
O debate nesta perspectiva foi “manco” até porque a interligação entre o público e o privado começa logo nas consultas nos centros de saúde, com a requisição de elementos complementares de diagnóstico.
E onde vão os utentes, cidadãos da nossa praça e do país, para fazer análises clínicas, TAC’s e RX’s?
A articulação local e regional da saúde, não se faz apenas entre a estrutura hospitalar – geral e especializada – e o Agrupamento de Centros de Saúde (ACES) mas deve ser encarada como um todo, incluindo a iniciativa privada que é muito forte.
A lacuna no debate, desta complementaridade entre serviço público e serviço privado, que na prática existe e é eficiente, faz com que a Saúde não seja apenas um tabu público, pago pelo OGE.
Se a linha do tempo recuar ao tempo da pandemia, constaremos que, afinal, público e privado entenderam-se bem em tempos de crise da covid-19. Há um exemplo, evidente para a realização de cirurgias e outros actos médicos entre o Hospital Senhora da Oliveira e o Hospital de Riba d’Ave para não falar de outros.
Novais de Carvalho, do ACES do Alto Ave, acentuou que o fim geral de qualquer sistema é que produza “resultados convincentes” em favor do utente. Uma forma de deixar claro que o modelo em que assenta a prestação de cuidados deve ser vista à luz dos resultados que provoca. E citou estudos que ainda não dizem claramente que uma ULS tenha produzido melhores efeitos.
Esta constatação vai de encontro ao que Henrique Capelas, da administração do Hospital Senhora da Oliveira (HSOG) de que, afinal, o alfa e ómega do SNS é a sua gestão e a sua eficiência.
Aliás, Capelas foi claro ao apontar o dedo a um sistema de saúde “mais virado para a doença do que para a prevenção”, o que torna o nosso país, no contexto da União Europeia, aquele onde “o cidadão mais paga” para beneficiar de assistência na saúde.
Sublinhou que o SNS em Portugal “é bom” para além das questões de sustentabilidade financeira. Mas não tem dúvidas em afirmar que o SNS já não é tão bom “em termos de gestão”.
Falou do reforço da estrutura do SNS, nos últimos cinco anos: incorporou mais profissionais de saúde, melhorou as unidades com médicos de família, aumentou o número de consultas e cirurgias que ainda se mantém para além do prazo de garantia.
E do reforço das compensações financeiras ao nível do OGE no SNS. “Mas não é por colocar mais dinheiro na Saúde que o sistema melhora ou não melhorou tanto como devia ter melhorado”.
Reconheceu que o acesso às consultas externas e às cirurgias ainda continua “difícil” e sem papas na língua, afirmou “não vale a pena escondê-lo!”
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Não teve dúvidas em afirmar que “este modelo (do SNS) está esgotado” porque ainda não coloca o cidadão no centro do sistema. E deu exemplos de quantas capelinhas o utente tem de percorrer, “num ambiente de ping-pong”, para que consiga tudo quanto precisa do apoio do sistema de saúde.
“Isto não é ter o cidadão no centro do sistema” – disse Henrique Capelas ao mesmo tempo que defendia a necessidade de fazer “uma profunda reforma no sistema”.
Como autor da Unidade Local de Saúde do Nordeste, o administrador do Hospital Senhora da Oliveira influencia a adopção de ULS’s em algumas zonas do país. E no caso de Guimarães coordena o grupo que há-de propor a sua implantação. Sempre com a intenção de integrar cuidados e centralizar a gestão de equipamentos e estruturas.
Disse mesmo que, desde 2003, a OMS – Organização Mundial de Saúde – advoga, incentiva e apoia a integração de cuidados, o que já existe em muitos países e até aqui na vizinha Espanha e na Galiza.
Declara que “as ULS’s ainda não são uma integração à séria”… Voltando a sublinhar que se as ULS’s não atingem os seus objectivos é apenas “por questões de gestão”.
Definiu as ULS’s como uma espécie de loja do cidadão – onde o utente está no centro do sistema – sem explicar, contudo, como os serviços de saúde privados, há muito implantados no território e com boas práticas, vão sobreviver, deixando de prestar serviços complementares de diagnóstico.
Sem dúvida que Henrique Capelas defendeu um sistema de saúde centralizado – baseado num centro de produção de serviços virado para o cidadão. Mas estará a estrutura pública equipada com meios para poder prestar um serviço de saúde, chave na mão?
É evidente que não passando este debate, de uma conversa tertuliana em que os convidados falaram o que quiseram sem grandes perguntas do auditório, composto por pessoas ligadas à saúde, um coro de políticos locais em ascensão e outros cumprindo obrigações partidárias, não houve tempo para retirar ao debate o seu pendor generalista, deixando a especialidade para outra oportunidade. Tal como as dúvidas que resultaram do pensamento dos actuais protagonistas do SNS em Guimarães.
Muitos números foram lançadas para a conversa, quer por Henrique Capelas quer por Novais de Carvalho. Tal como será, no futuro, o papel das autarquias num universo de cuidados especializados em que a vida do cidadão está em jogo.
Quanto custará uma ULS no Alto Ave? Haverá mudança de sede? Precisará de um novo edifício. O debate abriu novos caminhos a sulcar na procura da melhor estrutura para se gerir um sistema localmente, que tenha a participação do Estado como o seu principal financiador.
E, se tudo, no final vai ser resolvido sem prazos, à vontade de um Governo ou de um Ministro. Ou até de um autarca que resolva fazer de serviços públicos uma espécie de desígnio pessoal.
Depois, e finalmente, como Henrique Capelas bem sublinhou, não é só sistema de saúde que tem de mudar de paradigma. As pessoas também terão de mudar, “todos temos de mudar”…
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