Em meados de Agosto aconteceu o acampamento em Defesa do Barroso, que teve certa visibilidade na comunicação social e parece motivado por interesses locais. Afinal, para ali foi recentemente aprovada a construção da maior mina a céu aberto da Europa, algo em completa contradição com seu estatuto de Património Agrícola Mundial, galardão auferido pelas Nações Unidas para poucas regiões do mundo com práticas rurais exemplares.
Também a resistência à Mina do Romano entende-se claramente, pois consumirá e contaminará a água da agricultura, porá em maior risco animais em vias de extinção e criará apenas cerca de 80 empregos. Certamente os bons salários serão para especialistas de fora e, pior, já está previsto o esgotamento da exploração do lítio em cerca de 13 anos, após causar uma destruição permanente.
E aqui, à nossa porta, a mina de Seixoso-Vieiros poderá afetar os concelhos de Felgueiras, Fafe, Guimarães, Amarante, Mondim de Basto e Celorico de Basto. Segundo o “Movimento Seixoso-Vieiros: Lítio Não”, além da destruição da paisagem, poluição do ar, da água, do tráfego intenso de caminhões, moradores se queixam da desvalorização de uma grande quantidade de imóveis.
Porém, juntam-se aos moradores e moradoras desses locais organizações tão diversas como a Extinction Rebellion, Rede para o Decrescimento, Rede 8 de Março e outras, de âmbito nacional. Porquê? O lítio não é importante para combater a crise climática? Uma nova indústria não trará desenvolvimento e qualidade de vida? A resposta, que parece paradoxal, é que não. Isto pode se perceber mais facilmente se for avaliado a nível planetário por um período mais alargado de tempo, que é o que vêm fazendo estudiosos do sistema terrestre estável (que inclui o clima, a biodiversidade, a água potável e outros elementos imprescindíveis para a vida como a conhecemos no planeta).
Estes estudos foram avaliados pelo Painel Intergovernamental para Mudanças do Clima (IPCC), das Nações Unidas, que acabou por apontar que a única forma de se regenerar um equilíbrio ecológico e minimizar o aquecimento global é pela redução das atividades de extração de recursos naturais e sua consequente deposição posterior no ambiente, na forma de resíduos e poluição.
Tudo que se produz é a partir da natureza e tudo volta para ela. As linhas elétricas precisam de cobre, os carros precisam de ferro, as baterias precisam de lítio, todos materiais não renováveis, cuja produção é altamente poluente e que estão fadados a se esgotar. Aliás, já é sabido que todo o lítio do mundo não será suficiente sequer para se eletrificar todos os carros do mundo. É uma destruição hoje que só aumenta o problema amanhã. Também é sabido que a atividade humana já ultrapassou a capacidade de reposição e absorção pela natureza há pelo menos 40 anos. Ou seja, se os recursos naturais são como um lago a ser enchido por um ribeirão, ele está a baixar de nível a cada ano. Com a diminuição da humidade, o próprio ribeirão perderá vazão. Isto significa que, previsivelmente, ficaremos sem o lago e sem o ribeirão, seja em breve ou em algumas décadas. Ora, quando isso acontecer será uma herança macabra para nossos descendentes.
Então, para que o lago não seque totalmente e que o ribeirão não morra, é preciso que a atividade humana deixe de crescer enquanto há água. Para que eles se regenerem e voltem a ser abundantes, é preciso que a atividade humana seja reduzida. Em termos das mudanças necessárias, não significa tomar banhos mais curtos. O que os números do Estudo de Impacte da Mina do Romano mostram é que essa mina consumirá mais água que todas as pessoas do concelho de Montalegre para produzir baterias para carros que, em poucos anos, serão lixo tóxico. Isto é que tem que mudar, não os banhos.
O que está em causa na luta anti-extrativista não é apenas a destruição de uma aldeia trasmontana, a extinção do lobo ibérico ou a desvalorização de imóveis na Lixa. O que está em causa é um sistema económico que está a destruir o planeta e que anuncia que a única forma de resolver os problemas que criou é pelo crescimento da troca de mercadorias, mesmo que sejam lixo. O que propõem esses movimentos de resistência é que a resolução dos problemas socioambientais pode se dar pelo simples cuidado. Não há necessidade de mineração para esse fim. Cuidar da natureza pode regenerar o clima, cuidar das pessoas pode regenerar a sociedade. Lembra-se do auge da pandemia? Deixando de lado por um minuto o cinismo, sabemos que há coisas que o dinheiro não pode fazer.
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Belíssimo artigo, muito obrigada!