No primeiro fim de semana de Maio, o Centro Cultural Vila Flor recebe a mais recente criação de Beatriz Batarda. Construído com um grupo de alunos do ensino artístico, “C., Celeste e A Primeira Virtude” tem dupla apresentação no Pequeno Auditório do CCVF, às 21h30 dos dias 5 e 6 de Maio, Sexta e Sábado, respectivamente.
Em declarações ao Guimarães, agora! a criadora revela que foi Guimarães quem a escolheu, e não ela que escolheu Guimarães. “Eu tenho uma relação, desde o início do centro cultural, com as várias equipas que vêm passando pelo centro cultural porque tenho tido essa sorte de ser programada, seja enquanto intérprete ou enquanto artista criadora”.
“É um espectáculo que vai chegar a Guimarães com algum ritmo, já bastante livre, não preso às chamadas marcações da encenação.”
Quanto ao espectáculo, a estreia aconteceu em Lisboa, dia 11 de Abril, e aí ficou durante duas semanas, estando agora em apresentação em Viseu. “Por isso, é um espectáculo que vai chegar a Guimarães com algum ritmo, já bastante livre, não preso às chamadas marcações da encenação, que é o que acontece nos primeiros dias da apresentação”, refere.
Beatriz Batarda, aqui simultaneamente autora, encenadora e actriz, conta que o processo de criação desta peça começou já em 2019, com um monólogo. “Apresentei-o em 2019, no Porto. Já era um texto ficcionado sobre uma professora em crise com a forma como ensina, como ensinava e com a sua relação em crise com os seus alunos, ou com a pessoa que é. Portanto, um processo de civilização da sua identidade”, relata.
Beatriz explica que quando apresentou o monólogo, “ainda mesmo em processo de ensaios”, ficou claro que o texto era “bastante superficial porque não apanhava os outros pontos de vista” e, por isso, “parecia que seria um bom início para uma coisa mais complexa”. Assim que teve oportunidade, começou um processo de investigação durante o qual foi recolhendo uma série de testemunhos de alunos das artes. “Parecia-me importante criar aqui, através desta alegoria que será o ensino das artes, uma reflexão sobre o ensino em geral”, justifica.
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“Esta nossa relação com o ensino pede, grita por mudanças, por alterações que se vêm a fazer gradualmente.”
Na perspectiva e análise da autora, “esta nossa relação com o ensino pede, grita por mudanças, por alterações que se vêm a fazer gradualmente, mas que, à velocidade que as transformações no mundo vão, parece uma transformação quase inexpressiva”. Nesse contexto, durante a pesquisa, que durou cerca de dois anos, promoveu cinco encontros com antigos alunos de teatro que leccionou, e com alunos de outras áreas, das artes plásticas, de música e dança. Ao todo, reuniu cerca de 43 jovens do ensino superior.
Batarda descreve a peça como “um grupo de alunos que estará no seu último ano de universidade, enfim, ensino superior artístico e que está a preparar o último espectáculo. E perante esta pressão que desperta uma série de, não só inquietações, mas medos gerados por esta pressão, que é a iminência de entrar na vida do mundo adulto”. O espectáculo explora a “necessidade de construir uma identidade individual que vai se tornando mais urgente. E nessa necessidade de construir a identidade do indivíduo e projectar a idealização daquilo que será uma identidade colectiva, vão-se gerando pequenos e grandes equívocos entre estes alunos”.
A autora descreve que, ao longo da peça, “vão-se abrindo feridas cada vez maiores entre eles. E, perante este desconforto de estarem a abrir feridas entre eles, de uma forma quase instintiva direccionam a sua frustração e, de certa maneira, a sua raiva, para o poder, para se poderem proteger enquanto grupo”. Aqui, o poder é representado pelo sistema de ensino, pela professora, a Mestre, interpretada por Beatriz Batarda. “Juntos direccionam um conflito, um ataque a esta mestra, que é um ataque que é maior do que aquele que seria o natural entre gerações. Esse conflito geracional é um conflito saudável para ambas as partes”. A autora acredita que este conflito intergeracional permite aos mais velhos manterem-se “mais actualizados e ligados à curiosidade dos outros”, e aos mais novos obriga-os a “posicionarem-se, a definirem-se”. No entanto, na peça, o conflito extrapola essa saúde, “potenciado aqui por uma série de inquietações da nossa contemporaneidade, destas movimentações que se fazem sentir, políticas sociais e económicas, possivelmente resultantes de uma consciência de que chegámos a um limite”, explica a encenadora.
Beatriz Batarda revela que registou em vídeo todo o processo de investigação e de reunião com os alunos, em parceria com Rita Quelhas. “Este material que eu fui recolhendo em vídeo era material unicamente para servir o propósito da escrita da peça, mas que provou ser, ele próprio, um material muitíssimo interessante e rico, e ele próprio um objecto que merecia ser partilhado com o público”. Assim se estreia a actriz e encenadora na realização de um objecto audiovisual e nasce o projecto “Corpos Celestes”, um vídeo-instalação em cinco actos, cinco ecrãs, cinco histórias narradas a partir de testemunhos de jovens artistas que vêem o rumo das suas vidas suspenso: depois da vida de estudante e antes de atingirem a visibilidade pública.
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Quanto ao acumular de funções que assume neste projecto, autora, encenadora e actriz, Batarda revela que “só complica e é muito difícil de fazer”, tendo sido uma decisão “que no fundo é um reflexo da pobreza, dos recursos que nós temos”. “Na verdade, eu teria ficado muito bem só com a escrita da peça e eventualmente proposto outra pessoa a encenar ou, no limite, escrever e encenar. A parte de entrar como actriz tem a ver com a economia”, denota.
Os bilhetes para cada uma das apresentações do espectáculo (5 e 6 de Maio) têm o valor de 7,50€ ou 5,00€ com desconto, já estando disponíveis via online e presencialmente nas bilheteiras dos equipamentos culturais geridos pela A Oficina. A sessão do dia 6 de Maio conta com interpretação em Língua Gestual Portuguesa (LGP) e com Audiodescrição (AD).
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